EDUCAÇÃO LIBERTÁRIA

Educar é dar condições a cada pessoa para que ela se descubra, enquanto indivíduo livre e enquanto ser social, é dar condições para que cada pessoa possa perceber e realizar, na justa medida, a dialética do indivíduo social, a sua liberdade na liberdade do outro (Sílvio Gallo, 1995).

Características educacionais

A Educação Libertária está embasada em ideias anarquistas.

Os anarquistas acreditam que a educação, tanto a formal – oferecida nas escolas – quanto a informal – adquirida através das relações sociais –, é um fator favorável para a transformação social. Entretanto, fazem críticas a determinadas propostas pedagógicas, como por exemplo, a educação tradicional, pois esta reproduz a estrutura social – de dominados e dominantes – que vivemos (Gallo, 1996).

Na educação torna-se importante haver liberdade para ser e criar, e possibilitar a igualdade de consideração humana e de oportunidades, portanto, Silvio Gallo (1995) defende ser o lugar propício para a atuação dos ideais anarquistas.

Um dos fundamentos da Pedagogia Libertária é defender a educação integral e igualitária, tendo como finalidade a emancipação do trabalhador e, consequentemente, de toda a sociedade (Silva, 2004). Também trabalha com o princípio de liberdade e vê o princípio de autoridade como meio de inserir-se na sociedade atual. “Uma educação anarquista coerente com seu intento de crítica e transformação social deve partir da autoridade, não para tomá-la como absoluta e intransponível, mas para superá-la. O processo pedagógico de uma construção coletiva da liberdade é um processo de des-construção paulatina da autoridade” (Gallo, 1996). “O objetivo da pedagogia anarquista é a liberdade, é formar indivíduos livres, conscientes, capazes de uma vida solidária em sociedade” (Gallo, 1995, p.31).

Com relação à liberdade, Bakunin afirma que “com o progresso cultural e o desenvolvimento da civilização, o homem vai aos poucos se libertando das fatalidades naturais, construindo seu mundo e conquistando a liberdade” (Gallo, 1995, p.24), acrescentando ainda que “o direito à liberdade sem os meios de realizá-la não é mais que um fantasma” (Gallo, 1995, p.26). E a educação (formal, informal ou não formal) tem um grande papel para possibilitar a conquista dessa liberdade, pois é através dela que o ser humano entra em contato com a cultura, que é o produto de toda a civilização.

Em contrapartida, numa sociedade capitalista, não existe a possibilidade de haver liberdade, uma vez que ela é sustentada na desigualdade, na exploração de grande parte da população. Aqui, a educação baseia-se na construção de sujeitos para aquilo que a sociedade quer que eles sejam e não para aquilo que ela é. “Consciente de si mesma, de suas singularidades, de suas diferenças e da importância de seu relacionamento com o grupo social para a construção coletiva da liberdade” (Gallo, 1995, p.36), que é o que a educação libertária defende.

Assim, esta se caracteriza por uma educação sem prêmios ou castigos, sem provas ou notas e centrada no interesse do aluno (Silva, 2004). A proposta anarquista, diferentemente de outros movimentos, acredita que a escola deveria ser criada pelo próprio trabalhador, já que é ele próprio que deve conquistar sua liberdade, não aceitando a reprodução social oferecida pela classe dominante (Gallo, 1995).

Esta pedagogia está contra as escola públicas (Gallo, 1996), acredita na autogestão do ensino – ou seja, o processo educacional deverá ser gerenciado pelos próprios envolvidos – educação gratuita, sem uma hierarquização dos professores e liberdade de organização (Silva, 2004). Isto é, o ensino seria reflexo dos interesses e desejos da própria sociedade (Gallo, 1996).

A autogestão, por sua vez, pressupõe que todos os envolvidos trabalhem ativamente no processo educativo, possibilitando com que todos aprendam (não somente o aluno) – Tragtenberg justifica que o saber e a ignorância não são absolutos, tanto no caso de professores quanto no caso de alunos (Silva, 2004).

Contexto histórico

Ideias anarquistas chegaram ao Brasil durante a primeira República, como crítica à ideologia burguesa e ao capitalismo, influenciando a educação (Aranha, 2006). Desta maneira, criticava a educação convencional, acusando-a de não preparar as pessoas para pensar, mas de transmitir um conhecimento pronto acerca de uma visão de homem e de mundo, formando sujeito com base nas necessidades da sociedade. “A educação tradicional capitalista é, ao mesmo tempo, reflexo e fonte da desigualdade social, disseminando uma visão de mundo que garante a acomodação, e ensinando ricos e pobres a se conformarem com a estrutura social, que deve ser percebida como inevitável e imutável” (Gallo, 1995, p.35).

“Enquanto os socialistas reivindicaram maior empenho do Estado para estender a educação a todos, os anarquistas, conhecidos críticos das instituições, rejeitavam os sistemas públicos por considerá-los ideológicos, divulgadores de preconceitos e comprometidos com os interesses da classe dominante. Atribuíam a cada grupo social a responsabilidade pela organização da educação, ou seja, para eles, a tarefa de educar cabia à comunidade anarquista” (Aranha, 2006, p.301).

Seguindo essas ideias, foram fundadas no país diversas escolas anarquistas, em quase todos os estados. Nelas, havia a co-educação, ou seja, num mesmo ambiente havia tanto meninas quanto meninos – porque consideravam que o convívio de ambos os sexos saudável – e também mesclavam crianças dos variados segmentos sociais – estimulando, assim, a convivência entre eles. “Defendiam a instrução científica e racional, a educação integral, e enfatizavam o ensino laico (…) também procediam à ampla politização do trabalhador” (Aranha, 2006, p.301).

 

Referências bibliográficas:

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. História da educação e da pedagogia: real e Brasil. 3a. ed, São Paulo, Moderna: 2006.

GALLO, Sílvio. O Paradigma Anarquista em Educação. In: Nuances, Presidente Prudente: FCT UNESP, n° 2, 1996. Disponível em: http://www.sitinn.hpg.ig.com.br/oparadigmaanarquistaemeducacao.htm. Acesso: 7 ago. 2007.

GALLO, Sílvio. Pedagogia do risco: experiências anarquistas em educação. Campinas: Papirus, 1995.

SILVA, Antonio Ozaí. Maurício Tragtenberg e a pedagogia libertária. (tese de doutorado em educação) São Paulo, USP: 2004.