* Texto escrito por Iracema Cerdan Zavaleta Galves
A paideia, no século V a C., era um ideal de formação constante, contudo, é um conceito difícil de se exprimir por ser algo num parâmetro generalizado. Atualmente, poderíamos tentar traduzi-la como civilização, cultura, tradição, literatura, ou educação, mas nenhuma dessas expressões consegue exprimir exatamente o que ela significa.
A formação constante do ser humano era muito visada. Na civilização micênica, os guerreiros eram valorizados, e era através de suas ações que as comunidades cresciam. Com a transição para os Tempos Homéricos, a tradição guerreira permaneceu, sendo que a educação tinha como objetivo a formação militar do nobre, que tornar-se-ia um “guerreiro belo e bom”. Suas qualidades, próprias de um ser divino, eram a prudência, lealdade, hospitalidade, honra, glória e o desafio à morte. A criança, aos sete anos, era enviada para outros nobres, a fim de se educar e propiciar a si mesma uma posterior participação nas assembleias e nas batalhas (guerras). Os mitos e poemas de Homero eram proferidos em praça pública, e tinham conteúdos básicos de educação escolar.
No período Arcaico, a escrita regressou à civilização grega; surgiram também a moeda, as pólis e o pensamento filosófico. A educação de Atenas se preocupava com a formação intelectual. As meninas ficavam em casa, aprendendo os afazeres domésticos. Já os meninos partiam para a alfabetização e a educação física e musical. A educação tinha três níveis: elementar, secundária e superior (sofistas, assim como Sócrates, Platão e Aristóteles). Em Esparta, a educação era militarizada, além de estudarem música, canto e dança coletiva.
Desde o século V a.C., como pudemos observar, busca-se um ideal de formação no qual o ser humano faça parte constantemente desse processo. Assim, verifica-se que o conceito de Paideia era muito amplo e tentava abarcar a totalidade humana. Porém, mais de 25 séculos depois, que tipo de formação buscamos propiciar a nossos alunos?
Segundo a Constituição de 1988, artigo 205, ‘a educação (…) será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa’. Além disso, o artigo 22 da LDB diz que ‘a educação básica tem por finalidade desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da sociedade e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores’.
Desse modo, espera-se que o aluno tenha uma formação básica que contemple:
- o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo;
- a compreensão do ambiente natural e social, político, tecnológico, das artes e valores;
- o desenvolvimento da capacidade da aprendizagem;
- o fortalecimento dos vínculos de família;
- o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico.
Assim, podemos perceber que legalmente, no Brasil, espera-se que, ao passar pela educação formal, o discente se aperfeiçoe e se forme em todos os seus aspectos, efetivamente, como um ser humano em sua totalidade. Mas será que todos esses aspectos e particularidades do homem são respeitados durante o processo educacional? Será que esse processo é visto como integrado ou fragmentado?
Hoje, novas teorias estão aí para auxiliar a prática docente e da educação como um todo, mas percebemos que ainda somente a parte intelectual do indivíduo é valorizada.
Gardner, por exemplo, nos oferece a teoria das inteligências múltiplas, na qual tira a ênfase da inteligência matemática, tão valorizada – como nos testes de QI – e mostra que há outros tipos de inteligência, e que uma pessoa pode não ter um bom raciocínio lógico, mas ser excelente ao expressar-se numa peça de teatro. E aí indagamos: uma pessoa que resolve um problema matemático é melhor do que aquela que se expressa corporalmente?
Gardner propõe inteligências, como as descritas abaixo:
– Lingüística: habilidade de comunicação e de compreensão linguística;
– Lógica-matemática: ligada à capacidade de raciocínio dedutivo e à facilidade em lidar com grandezas e relações de tipo matemático e numérico;
– Espacial: habilidade em captar relações espaciais, capacidade em situar e manipular inteligentemente os objetos;
– Musical: tem grande maleabilidade musical, expressando-se facilmente através da música;
– Corpóreo-cinestésica: capacidade de resolver problemas ou elaborar produtos, utilizando o corpo e seus movimentos de maneira altamente diferenciada e hábil, para propósitos expressivos;
– Naturalista: perceber a natureza de maneira integral;
– Pessoal – subdividida em duas: interpessoal (capacidade de compreender as demais pessoas) e intrapessoal (capacidade do auto-conhecimento, da aceitação, da comunicação consigo mesmo).
Assim, levantamos uma questão: Por que ainda nas escolas, valorizam-se apenas alguns tipos de inteligência? Por que continuamos tendo 5 aulas de Língua Portuguesa, por exemplo, e uma de Arte?